Samora era um homem do povo
Samora Machel, primeiro Presidente de Moçambique independente, falecido a 19 de Outubro de 1986 (faz hoje 29 anos) nas montanhas de Mbuzini, África do Sul, vítima de acidente aéreo num esquema orquestrado e executado pelo ex-regime do “apartheid”, era um homem do povo e fiel intérprete das suas aspirações.
Quem assim o considerou foi o Governador da província de Maputo, Raimundo Maico Diomba, falando, sexta-feira, em Mbuzini, nas cerimónias alusivas à passagem do 29.º aniversário daquela tragédia. Tratou-se dum acto co-organizado pelo Governo da província de Maputo e pelas autoridades governamentais sul-africanas da província de Mpumalanga, para recordar as vítimas da tragédia ocorrida na fatídica noite de 19 de Outubro de 1986 e de modo especial ecoar o nome de Samora Machel, o lutador incansável pelo desenvolvimento de Moçambique e de África, o nacionalista recto, destemido comandante da guerrilha, o proclamador da independência nacional e o internacionalista solidário com os povos oprimidos do chamado continente negro e do mundo.
Para Mbuzini afluíram na última sexta-feira centenas de pessoas, moçambicanos e sul-africanos de diferentes estratos sociais, onde, justamente no memorial erguido em homenagem às 33 vítimas mortais do acidente aéreo, cantaram cânticos evocando a sua memória, dançaram, travaram e aprofundaram conhecimento sobre o acontecimento e escutaram as mensagens dos dirigentes governamentais dos dois países a propósito da tragédia.
No seu discurso proferido na ocasião, Raimundo Diomba afirmou que Samora Machel era um dirigente persistente na luta pela paz, pela harmonia e pelo entendimento entre os homens. Encarnou os mais sublimes sonhos do povo moçambicano e de corpo e alma entregou-se, ele próprio, como mecanismo para a sua realização.
Samora Machel palmilhou planícies e vales, galgou montanhas, consentiu sacrifícios, correu riscos, mas persistiu porque, disse o governante, a busca de liberdade e independência para o seu povo, para a sua pátria ocupada era imperativo insubstituível. Disse que falar do Presidente Samora Machel é falar do mundo, da África e é, acima de tudo, falar de cada um, dos moçambicanos e do cidadão do mundo em geral.
“Falar de Samora Machel e apresentarmos o nosso compromisso na luta que travamos pela liquidação dos males que enfrentamos, é falar dos desafios que vamos tendo ao longo das nossas vidas individuais e colectivas. Recordar o Presidente Samora Machel é buscar a inspiração, a força e a dinâmica para a prossecução da longa caminhada pela consolidação da paz e da unidade nacional em Moçambique. Em Mbuzini, recordamos e exaltamos Samora Machel, porque queremos que a sua figura e os seus ideais se perpetuem como referência, como modelo e como exemplo para a nossa juventude. Temos de ensinar aos nossos filhos o respeito, a educação, a moral, o trabalho, a unidade nacional”, indicou.
Raimundo Diomba afiançou que não se pode deixar que o tempo apague da nossa memória colectiva que antes de ser um grande líder político, um militar destemido e determinado, Samora Machel era, acima de tudo, um pacifista. Por isso, disse, Samora continua vivo em cada um de nós, olhando para os nossos rostos, nos ideais que defendemos seguindo a sua visão, a justeza das causas que defendeu, do amor que conquistou do seu povo, do exemplo de determinação e perseverança e da sua inabalável crença na fora de um povo unido para vencer os desafios.
“Samora Machel continua vivo na memória do povo moçambicano e do mundo e em cada um de nós, na defesa da paz que queremos que perdure no nosso Moçambique”, disse, acrescentando que ele foi e continuará a ser figura incontornável no coração dos moçambicanos.
Falando a propósito das manifestações culturais apresentadas na ocasião, tanto da parte moçambicana como da sul-africana, Diomba afirmou que elas simbolizam a histórica tradição de amizade entre os dois países e povos.
“A makwayela, do grupo Paz no Mundo, recordam os mineiros moçambicanos que ao lado do povo sul-africano constroem e edificam este grande país que hoje se tornou numa grande potência económica da África. O xigubo que vimos e sentimos é oriundo de um dos distritos da província de Maputo, é uma dança guerreira que usa paus, para uma exibição artística, sabido que outrora foram usados como armas nas guerras de expansão tribal e também nas guerras de resistência contra a invasão estrangeira”, explicou, sublinhando que com Samora os moçambicanos aprenderam que a cultura é o sol que nunca desce.
O governador da província de Maputo endereçou uma saudação particular ao povo sul-africano, representado no acto pelas autoridades governamentais de Mpumalanga, pelo acolhimento oferecido à comitiva moçambicana em Mbuzini, afirmando que se tratou dum gesto que comunga o sentimento de perda mas também de partilha da vontade e determinação de continuar a lutar para o bem-estar dos dois povos e países.
MBUZINI CONTINUARÁ REFERÊNCIA HISTÓRICA
Mbuzini sempre será um local que lembrará a história e entrega dos povos moçambicanos e sul-africano na sua luta contra o colonialismo português e o ex-regime do “apartheid”, segundo afirmou a representante do presidente da Câmara Municipal de Nkomazi.
Numa intervenção feita na ocasião, disse que desde a data em que se despenhou o avião (um Tupolev 137 A, de fabrico soviético) que transportava o Presidente Samora Machel e comitiva, Mbuzini tornou-se um ponto de encontro entre sul-africanos e moçambicanos.
Disse que os moçambicanos e sul-africanos devem fazer uma introspecção e interrogarem-se nos seus corações se estão preparados para defender a agenda africana. Afirmou que dado o seu carácter, Samora Machel impressionou os dirigentes do Congresso Nacional Africano (ANC) na Tanzania, nos tempos da luta de libertação nacional.
Fez várias citações de excertos das intervenções de Samora Machel feitas em diferentes momentos da sua governação, destacando o “nunca se pergunta a um escravo se quer a liberdade” e apelou para que os moçambicanos e sul-africanos tenham uma mente preparada para a liberdade e que eles próprios sejam os donos dos seus próprios destinos.
Disse que a luta para libertação económica dos dois povos e países ainda é longa mas não será perdida. Indicou que os desafios de hoje são diferentes dos de ontem e agradeceu a solidariedade prestada pelos moçambicanos ao povo sul-africano, na sua luta contra o regime do “apartheid”.
LÍDER TRADICIONAL “METE ÁGUA”
Um líder tradicional da região de Mahlalela, em Mbuzini, terá causado um certo mal-estar entre os moçambicanos presentes na cerimónia. É que durante a sua intervenção, em jeito de agradecimento, o líder tradicional disse, a dado momento, que Namaacha (distrito moçambicano que faz fronteira com a África do Sul e Suazilândia) pertence a Mahlalela, por razões históricas cujos fundamentos é a similaridade da língua falada nos dois pontos.
Este “incidente” levou mesmo o tradutor da parte moçambicana e um dos mestres da cerimónia a dizer que não concordava com o líder no assunto, antes mesmo de traduzir do inglês para o português.
O líder pediu a construção, na regiao, duma escola onde sejam ensinadas às crianças as línguas faladas em Moçambique e na África do Sul, como factor de consolidação da unidade entre os dois povos e países.
O acto culminou com uma visita guiada ao museu local.